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No mundo há 218 milhões de crianças que trabalham. No Peru, dois milhões. Duas psicólogas daquele país, Giselle Silva e Claudia Fuentes, perguntaram-se "que pensam e sentem as crianças trabalhadoras sobre o trabalho infantil?" e colocaram a 384 crianças o repto de pintarem-se a si mesmas e que responderam a perguntas básicas como "porque trabalhas?" ou "se fosses pai ou mãe, deixarias que o teu filho trabalhasse?".
O resultado foi a exposição 'A Voz das Crianças Sobre Trabalho Infantil', apresentado o mês passado em Lima, no Encontro Internacional Pro-Criança.
Os resultados revelaram imagens, algumas das quais aqui que coloco, como a do início: uma criança de Arequipa que trabalha numa fábrica de tijolos e que se vê ameaçada por um adulto, "que pode ser seu pai", aponta Giselle. "O trabalho é feio porque me pesa", diz outra criança no seu desenho.
Muitos deles pintam-se chorosos, com lágrimas nos olhos. Outros, com gotas de suor. A maioria, andrajosos, com as roupas rotas e cheias de remendos. Há uma criança que pinta a cores todo o desenho menos a ela: "Indica como maneja a sua afectividade", aponta a psicóloga, Giselle Silva, uma das autoras do estudo sobre o trabalho infantil através dos desenhos das crianças.
Se os desenhos já, por si, são incómodos para a consciência, algumas das frases, que põem na boca dos personagens desenhados, encolhem o coração:
"Papá, a professora pediu-me um sol (moeda peruana equivalente a vinte e cinco cêntimos, em euros) para a tarefa", diz uma criança no seu desenho. "Ah, não tenho dinheiro e vens-mo pedir, seu pedaço inútil", responde o pai, representado com uma garrafa numa mão e um pau ao alto na outra.
"Para que as crianças tivessem este nível de expressão, teve que haver uma preparação, uma conversação prévia dizendo-lhes que às crianças não se lhes dava a oportunidade de se expressarem, que não os escutavam e que agora tinham a oportunidade de fazê-lo, que tinham muito que dizer para que os adultos nos sensibilizemos e tomemos decisões que os favoreçam", explica a psicóloga.
Não forçaram ninguém. Participou quem quis e só dois não quiseram entrar no 'jogo'. Aos restantes encantou-lhes a experiência, assegura.
A segunda parte do encontro desenrolou-se através de perguntas. Uma das conclusões principais foi que, "enquanto na zona urbana uma criança que trabalha não é feliz, no campo uma criança que trabalha é feliz".
A criança das zonas urbanas marginais sente que não deveria trabalhar, embora creia que tenha que o fazer. Dizem: 'trabalhar é mau, eu não permitiria que o meu filho o fizesse'. A do campo, ao contrário, vê-o como algo de bom, sente-se de acordo com esse valor social e sente-se feliz. Dizem-nos: 'Os que não trabalham são ociosos e preguiçosos'.
Outra constatação é que as crianças 'urbanas' "estão mais expostas aos perigos. Temem um abuso, um assalto, um roubo ou uma violação quando saem à rua".
E não só trabalham, como pensam que, pelo facto de serem crianças, têm que cobrar menos. A maioria diz que ganha entre um e cinco soles. Mas um adulto, pelo mesmo tipo de trabalho, pode cobrar entre 25 e 40 soles por dia, afirma Giselle. "O dramático é que pensam 'como sou pequeno, mereço um salário pequeno'".
E quando poderá mudar a situação? Quando os pais se sensibilizarem e deixem de mandar a criança trabalhar, ou quando tiverem condições sociais para o fazer. Quando naquele e noutros países se mudarem as mentalidades e a ganância de quem governa.
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