O Último fuzilado pelo franquismo
Quando viu na televisão o retrato de Humberto Baena, deu-se conta de que não era aquele que julgava ter visto no lugar onde tinham assassinado um polícia e correu para a esquadra para corrigir o seu erro. O agente recebeu a testemunha com uma sugestão: "Não dê mais voltas, senhora. Estão todos no mesmo saco. Vá para casa e esqueça", sentenciou enquanto ajeitava a pistola.
O rosto que a televisão mostrava era o de Humberto Baena, membro da FRAP (Frente Revolucionária Antifascista e Patriótica) fuzilado em 27 de Setembro de 1975, somente dois meses antes da morte de Franco e cerca ano e meio depois do 25 de Abril em Portugal.
"Ela não pensava que o fossem matar. Escreveu ao meu pai dizendo-lhe que tinha remorsos", recorda Flor Baena, irmã de Humberto. Fernando Baena tentou reabrir o caso do seu filho com aquela carta um ano depois da sua execução.
Ninguém quis recebê-lo e, segundo a família, a carta ardeu. Aquele foi o primeiro tiro da justiça. Desde então, a família luta por escrever na história de Humberto Baena a palavra assassinado onde agora está escrito assassino.
Com essa petição dirigem-se à Comissão dos Direitos Humanos da ONU. É o seu último recurso.
"No Tribunal Constitucional disseram-nos que não podiam anular o juizo porque, quando ocorreu, a Constituição não existia e não se a podia aplicar com efeito retroactivo. O Tribunal de Direitos Humanos de Estrasburgo, indigna-se. Em 1977 Espanha não tinha ainda subscrito a Carta dos Direitos Humanos".
Perante o conselho de guerra, os advogados não puderam apresentar provas nem testemunhos, incluindo os que poderiam ter demonstrado que Humberto Baena estava em Portugal no dia em que assassinaram o polícia. Daquele juizo sumaríssimo sairam 5 condenações à morte, entre elas a de Humberto Baena. O tribunal militar, não respeitou nem a própria legalidade franquista, queriam mortos, rapidamente e a qualquer preço, que sirviriam para dar uma lição ao movimento popular antifascista em ascensão naqueles momentos.
As execuções emocionaram a opinião pública mundial de então. Em Paris, realizou-se uma grande manifestação onde se ouvia: "Franco assassino! Franco assassino!" Em roma milhares de manifestantes gritavam, Espanha livre! Espanha livre! Em Bruxelas atacaram a embaixada espanhola. Na Inglaterra o partido trabalhista anunciou uma resolução de total condenação. Em Amesterdão o governo holandês declarou o dia de "demonstração nacional" e os ministros juntaram-se às marchas de protesto.
Dois dias depois, o presidente mexicano, Luis Echevarria, pediu ao Secretário Geral das Nações Unidas que suspendesse a Espanha como membro da ONU. A partir daí o esquecimento...
Muitos dos documentos da família sobre o caso perderam-se num incêndio. Mas sobreviveu uma cópia da última carta de Humberto Baena: "Pai, mãe, executar-me-ão amanhã de manhã. Pedirei para que não me tapem os olhos, para ver a morte de frente. Que a minha morte seja a última ditada por um tribunal militar. Quero dar-lhes ânimo. Pensem que eu morro, mas que a vida continua".
A vida continuou, mas a justiça tarda.
Fontes: El País, Time.