Já aqui falei da sistemática matança de inocentes na Colômbia às ordens de Uribe. As denúncias continuam, de um dia para o outro, o rapaz que ganhava a vida como "estátua" num parque de Neiva o exército fê-lo aparecer como um guerrilheiro morto em combate. Enquanto, o país assiste horrorizado à denúncia de 1.155 vítimas de execuções como esta, a Procuradoria Geral da Nação investiga por todo o território colombiano.
Acusam-se as forças públicas de registar como guerrilheiros, caídos em combate, pessoas inocentes, os chamados "falsos positivos". Mais de 3.000 agentes das Forças Armadas são investigados, incluídos generais.
Álvaro Uribe gastou grande parte da sua política de segurança a combater a guerrilha, primeiro, num sistema de recompensas a civis que informariam sobre guerrilheiros, o qual gerou uma rede de delinquência ou negócio de mortos, e, segundo, na estratégia de privilegiar os incentivos militares segundo o número de baixas em combate.
Mais 13 militares foram destituídos por este escândalo, que se juntam aos 27 membros do Exército que já foram revelados há três semanas. Com estas destituições e a renúncia do comandante do Exército, Mario Montoya, responsável da operação em que foi libertada Ingrid Betancourt em Julho, o Governo, afirma o procurador, "pretendeu salvar a sua responsabilidade perante o Tribunal Penal Internacional". "Esta prática sistemática e generalizada, configura um delito de lesa humanidade", acrescentou.
Não são casos isolados. Em Neiva, coberto de branco da cabeça aos pés, Miller Andrés Blandón dirigia-se ao Parque Cívico para ganhar a vida como estátua humana. Tinha saído há pouco tempo de um centro de desintoxicação de drogas e convertido a Casa de Apoio ao Habitante da Rua como seu refúgio, disse o coordenador do programa, Antonio Torres. Em 17 de Julho, Blandón dirigiu-se ali para comer. Quando os indigentes terminaram, chegaram dois homens e ofereceram-lhes trabalho como apanhadores de café. Só três deles acreditaram na história e foram, dizem, "colher café".
No dia seguinte, as notícias do meio-dia davam conta que três guerrilheiros tinham caído em combate nas montanhas dos Andes do município de São José de Isnos.
Ao entardecer, um dos membros da Procuradoria que fez o levantamento dos cadáveres encontrou na carteira de uma das vítimas o seu documento de identidade: Miller Andrés Blandón, e um número de telemóvel. Chamou, e a segunda esposa do seu avô, Silvia Segura, negou que esse homem de 24 anos fosse guerrilheiro.
Os outros dois indigentes continuam enterrados como não identificados. Igual a muitos dos casos investigados em 14 departamentos, já que as pessoas procuradas não são da região, sequestram-nas, transportam-nas para longe da sua zona e logo o Exército as regista como guerrilheiros caídos em combate para evitar que alguém as reclame.
A Colômbia converteu-se num território minado por Uribe, ante a contínua denúncia destas execuções. A situação é de tal modo escandalosa que, dias antes da sua eleição como presidente dos Estados Unidos, Barack Obama viu-se obrigado, num dos debates da campanha, a assegurar que não celebrará com a Colômbia o Tratado de Livre Comércio
enquanto não houver garantias de respeito pelos direitos humanos.
São 1.155 mortes que a procuradoria investiga, como o caso de Miller Andrés Blandón, de indigentes, drogados ou marginais, mais outras 2.000 denunciadas por outras instituições. Tudo para cumprir com os resultados pedidos, obter ascensão na carreira, condecorações ou, simplesmente, para desfrutar de licenças em dias especiais. Ocorreu no Dia da Mãe de 2007, quando no Batalhão de Infantaria 31, o soldado Luis Esteban Montes advertiu infrutiferamente o seu comandante de que a pessoa que os seu companheiros tinham sequestrado, com o fim de fazê-la passar por um guerrilheiro morto, era o seu irmão.
Segundo as estatísticas do próprio governo, quando Uribe chegou à presidência, na Colômbia havia 15.000 homens das FARC. Segundo essas mesmas fontes, nestes seis anos desmobilizaram-se, foram capturados ou morreram em combate 55.000 guerrilheiros. As contas não encaixam. 45 milhões de colombianos interrogam-se perplexos se acaso vale tudo.